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Revisando Conceitos: DRM e Mídia Digital

Por Frederick Montero

Data de Publicação: 04 de Maio de 2007

"Diante de novas iniciativas no campo das tecnologias para gerenciamento de conteúdo digital (DRM), surge a oportunidade de rever conceitos e esclarecer opiniões a respeito da distribuição de mídia pela internet."

Há algum tempo atrás que eu escrevi uma série de artigos a respeito de distribuição de vídeos pela internet, centrados em um modelo conhecido como Vodcast, mas buscando analisar os diversos métodos de distribuição existentes, como o podcast, o download progressivo e o streaming de vídeo. Procuro sempre aprimorar os meus conceitos e de tempos em tempos, decido rever alguns textos antigos que escrevi. Mesmo que esses artigos não sejam muito antigos, desde que eu os deixei de lado, senti que alguma coisa ainda estava faltando para finalizar o seu desenvolvimento. Então percebi que eles necessitavam de um motivo ou razão para existirem. E a clara falta de um razão para a existência desses artigos ficou mais evidente quando comecei a receber comentários e críticas focadas na questão de uma possível preferência pelo streaming contra o download de vídeos, o que não é necessariamente o caso.

Por outro lado, alguns acontecimentos que se sucederam à publicação dos artigos me fizeram rever alguns conceitos e mudar algumas idéias a respeito do assunto. Até então, eu via como fato consumado que invariavelmente teríamos que futuramente conviver com alguma forma de proteção para o conteúdo distribuído em vídeo e áudio pela internet. Isso não por preferência minha, mas apenas por que eu acreditava que dificilmente as grandes gravadoras de música e os estúdios de cinema abririam mão de criar barreiras para a livre utilização de seus conteúdos pelos seus consumidores. E assim sendo, o mundo da informação e do entretenimento digital estaria dividido em dois campos: aqueles que possuem acesso aos mecanismos de DRM e aqueles que não têm acesso a esses mecanismos. Quem não tem acesso a esses mecanismos, na teoria ficaria refém da pirataria do seu conteúdo ou se veria obrigado a licenciar uma das tecnologias de DRM que lhe fossem oferecidas por um preço certo, se isso for possível, em alguns casos. A Microsoft, por exemplo, desenvolveu o seu sistema de DRM para lucrar em cima do licenciamento dessa tecnologia para quem, independentemente do tamanho do seu negócio, desejasse lacrar o acesso indesejado ao seu conteúdo. A Apple, por outro lado, tem o interesse de vender cada vez mais aparelhos eletrônicos, como iPods e AppleTVs, e para isso depende da oferta fácil de conteúdo específico para esses aparelhos. O problema da oferta de conteúdo para os iPods pôde ser solucionada com a criação da loja virtual para a venda de músicas, vídeos e filmes iTunes Store, mas então era necessário que a Apple se sujeitasse à imposição da indústria fonográfica de um sistema de DRM para bloquear as cópias piratas de seus produtos. O que também não deixou de servir com eficiência para a companhia da maçã, já que assim criava um sistema fechado que impunha o uso do programa iTunes e de todo o seu ecosistema de aparelhos para reproduzir as músicas compradas na sua loja virtual. Mas sua política centralizadora de controlar absolutamente todos os aspectos técnicos dos seus produtos conteve o licenciamento da sua tecnologia de DRM, com medo de acontecer o mesmo que aconteceu com os códigos de proteção do sistema anti-cópias dos discos HD-DVDs e Bluerays e colocar em perigo a confiabilidade do conjunto de equipamentos e programas de reprodução de mídia. Ou seja, apenas ela sozinha podia benificiar-se de um sistema de distribuição de mídias pela internet com conteúdo protegido, que cresce de maneira vertiginosa. O iTunes aumenta sua participação no mercado de reprodução de vídeo e áudio com taxas três ou quatro vezes maiores do que o Windows Media Player, líder do mercado. E analistas da área de informática calculam que já em meados deste ano, o iTunes irá ultrapassar o Real Player entre os programas mais utilizados para reproduzir streaming pela internet.

Resumindo, a tríade iPod/iTunes/Loja virtual (acrescida por enquanto do AppleTV) divide o mercado de distribuição de mídia entre o conteúdo protegido por DRM da Apple e o resto do mundo que não tem como restringir a reprodução indevida do seu material, em um sistema que promete no futuro controlar enorme parcela do mercado de informação e entretenimento digital. Imaginem que se eu trabalho em uma empresa de ensino à distância e queira desenvolver um modelo de podcast das nossas vídeo-aulas para meus alunos, que muito provavelmente vão utilizar o iPod como principal equipamento de reprodução de vídeo, não tenho outra opção além de correr o risco de distribuir o meu material sem qualquer proteção contra a distribuição pirata porque a Apple não licencia o seu sistema de DRM para outras empresas. Ou eu ignoro uma grande parcela do meu público-alvo, ou eu disponibilizo meu conteúdo por meios que dificultem a sua distribuição, como o streaming, ou eu trabalho com meu conteúdo sem DRM.

Ah, mas agora vem a grande pergunta do século:

Existe realmente algum problema nisso?

Aparentemente, não. Pelo contrário, por pressão dos grupos de defesa do consumidor na Europa e também pela diminuição no ritmo de crescimento das vendas de músicas pela internet, a EMI, uma das cabeças do quarteto de gravadoras que detêm o controle sobre a maioria das músicas distribuídas no mundo, decidiu liberar o seu catálogo de músicas e vídeos para a venda pela internet sem qualquer espécie de travas contra cópias e distribuição ilegal. Ótima notícia para consumidores que agora ganham a liberdade de comprar suas músicas na loja virtual que desejarem e reproduzirem esta música no programa e equipamento que mais lhe convêm. Mas essa iniciativa da EMI coloca pressão nas outras grandes gravadoras e também nas pequenas empresas de comunicação, educação e entretenimento por um sistema de distribuição de conteúdo sem as amarras das tecnologias de DRM. O segredo descoberto pela EMI é que não adianta tratar os consumidores como potenciais criminosos. Pelo contrário, vale mais a pena investir na qualidade dos seus serviços, facilitar ao máximo o acesso do consumidor aos seus produtos e criar atrativos que os afastem das alternativas ilegais. Nesta perspectiva, o controle sobre a distribuição de conteúdo em áudio e vídeo pela internet não pode mais ser uma desculpa pela opção do streaming como forma de transmissão e o download do material digital serviria perfeitamente em qualquer espécie de empreendimento pela web, desde que não envolvesse transmissão ao vivo, como em jogos de futebol e apresentações musicais.

Mas então tudo o que eu vinha falando sobre Vodcast nos artigos anteriores poderia ser simplesmente esquecido? Não necessariamente, porque o ponto central dos artigos não está na questão do download contra o streaming, mas da utilização de arquivos xml, como os dos Feeds RSS, para indicar os vídeos e áudios disponíveis para o espectador. Assim não importa qual o meio pelo qual o vídeo será acessado, download ou streaming, porque eles podem ser facilmente encontrados automaticamente por qualquer programa de reprodução de mídia que reconheça uma lista de conteúdo montada em xml. Apesar de tudo isso parecer complicado, o que interessa do ponto-de-vista do espectador é que uma única lista de vídeos pode ser traduzida facilmente para uma página na web, para um programa como o iTunes ou VideoLan, ou para um equipamento de Media Center, ligado diretamente a uma televisão. Deste modo, independente da forma como o espectador esteja acessando a sua programação, ele verá exatamente a mesma lista com o mesmo conteúdo em qualquer computador ou equipamento que venha a utilizar, não ficando restrito a acessar o YouTube para ver os vídeos que estão disponíveis por lá ou a encontrar um computador com iTunes ou VideoLan para assistir ao podcast que costuma acompanhar. A dicotomia entre streaming e download se redefiniria então em uma questão de conteúdo ao vivo, para ser transmitido por streaming, ou material gravado, para ser distribuído por download, deixando para a lista em códigos xml o papel de redirecionar para uma forma ou outra conforme o caso.

Sobre o autor

Frederick Montero, diretor, produtor e editor de vídeo. Formado em Filosofia pela Unicamp, é diretor do vídeo Supermegalooping, premiado no Primeiro Festival de Vídeos pela Internet. Mantém o blog sobre mídias digitais d1Tempo Digital.


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