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Ficção Científica? #13

Por Cesar Brod

Data de Publicação: 07 de Fevereiro de 2011

Reuben. Era esse seu nome. Ele não deveria saber disto. Não deveria ter memórias de quando havia sido Reuben. Doara seu cérebro para um bem maior. Sua capacidade de raciocínio privilegiada e todo o seu conhecimento deveriam servir à preservação da espécie humana. Ainda tinha a consciência de seu desprendimento, de sua opção magnânima, mas sentia-se incompleto. Talvez a falta de um desafio intelectual fizera sua mente cair novamente em necessidades básicas demais. Talvez tenha sido a falta de crítica do outro cérebro, anteriormente conectado ao dele, agora morto.

Monitorava Iran, sua saúde. Mantivera-o em estase talvez por tempo demais. Questionava suas ações. Invejava o fato de Iran ter um corpo, poder mover-se e explorar o planeta cuja visão os sensores externos sequer proporcionavam agora. Quando decidira, finalmente, por acordá-lo, não suportou por muito tempo suas perguntas e decidiu que ele deveria ficar mais tempo em estase. Uma decisão egoísta. Não tinha como saber quanto tempo ainda duraria a conexão cerebral com Iran e tinha que explorá-la. Não entendia exatamente como, mas o acidente, algo no planeta, alguma coisa, permitia que visitasse o cérebro em estase de Iran como quem visita uma biblioteca. Explorou suas memórias, sua inteligência, conheceu as técnicas de Ziembinski aprimoradas pelos exercícios de Iran e Freitas e o compartimento fechado onde sabia que Iran protegia algo importante. Mas haviam muitos compartimentos abertos. Reuben pôde colocar neles suas próprias lembranças de livros que lera, coisas que vivera e pôde comprovar que Iran as interpretava como sonhos.

A velocidade da conexão entre o cérebro em estase de Iran e o cérebro em ebulição de Reuben era a velocidade do pensamento. Tinha que ser rápido mesmo. Reuben sentia que teria pouco tempo e um instinto primitivo exigia que se preservasse. Os componentes da unidade reserva para a montagem do módulo planetário, seus coletores de energia e recicladores orgânicos teriam a única missão de alimentar um cérebro por muitos anos. O que faria com todos estes anos ainda não sabia, mas tinha que se preservar. Iran ficaria sem a unidade reserva, mas levaria anos até precisar dela, se precisasse. Além disto, Reuben iria garantir que a memória que Iran tinha da unidade reserva ficasse escondida, ao menos enquanto não necessitasse dela.

Reuben tinha que levar a experiência de Ziembinski além do limite de seu cérebro. Iria aproveitar a conexão do cérebro com Iran para plantar nele sua própria consciência, ao menos pelo tempo necessário para garantir sua preservação. Não podia dar-se ao luxo de falhar.

Entre o despertar de Iran, no 67.o dia a partir da queda no planeta, e o dia D, Reuben experimentou com sonhos. Plantou em Iran vários sonhos onde ele sentia sensações de queda, onde brigava, onde corria. Observou a reação de seu corpo aos sonhos e fez todos os ajustes de que precisava. No 100.o dia uma consciência desenvolvida por Reuben tomou conta das ações de Iran que, meticulosamente, explorou o planeta, encontrou um esconderijo em uma caverna onde montou o compartimento com o cérebro de Reuben e seu suporte à vida, ajustou os coletores de energia em local discreto, do lado de fora da caverna e retornou à sua câmara de estase. Reuben ainda garantiu que Iran estivesse devidamente acomodado e, pela última vez, utilizou a conexão cerebral com Iran para plantar-lhe as últimas informações que considerou relevante. A partir de agora teria apenas que, muito pacientemente, esperar.

Sobre o autor

Cesar Brod usa Linux desde antes do kernel atingir a versão 1.0. Dissemina o uso (e usa) métodos ágeis antes deles ganharem esse nome. Ainda assim, não está extinto! Escritor, consultor, pai e avô, tem como seu princípio fundamental a liberdade ampla, total e irrestrita, em especial a do conhecimento.

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