você está aqui: Home  → Coluna do Cesar Brod

De acordo com as Leis 12.965/2014 e 13.709/2018, que regulam o uso da Internet e o tratamento de dados pessoais no Brasil, ao me inscrever na newsletter do portal DICAS-L, autorizo o envio de notificações por e-mail ou outros meios e declaro estar ciente e concordar com seus Termos de Uso e Política de Privacidade.


Ficção Científica? #6

Por Cesar Brod

Data de Publicação: 09 de Fevereiro de 2009

Clique aqui para os capítulos anteriores.

Reuben despertou em um estado de consciência completamente desconhecido. Imediatamente tinha na memória todos os artigos científicos que havia escrito e começava a detectar em alguns deles alguns erros conceituais profundos e em outros possibilidades, antes impensadas, de avanços. Ouviu, sem exatamente ouvir, uma risada. Era como se uma consciência, ao melhor estilo do grilo falante da história de Pinóquio, houvesse invadido seu cérebro.

"Perdão por divertir-me com isto, Reuben! É que esta é a reação normal entre cientistas do seu nível. Uma vez expandido seu nível de consciência e memória, a primeira coisa que vocês fazem é remoer seus próprios trabalhos e o de outros cientistas, querendo consertá-los ou aprimorá-los. Infelizmente, não temos tempo para tratar disto agora, ainda que seja extremamente importante esta crítica a conceitos anteriormente desenvolvidos..."

"Dr. Kazinski?"

"A essência dele, sim. Seu cérebro já conta com uma interface para comunicar-se, inicialmente, comigo. Com o passar dos dias, com seu treinamento, ela será habilitada para a comunicação com os demais colegas. Eu já falo com todos eles e posso adiantar-lhe que temos um grupo bastante interessante aqui."

"Todos os dezoito?"

"O procedimento de expansão cerebral é bastante invasivo, sempre temos algumas baixas, por isso deixamos muito claros os riscos. Vocês estão em 17. É uma belíssima taxa de sucesso. Doze de vocês embarcarão com os pilotos, que já estão sendo treinados."

-oOo=

"Você estava certo, Freitas, Kazinski continua vivo, se é que se pode definir o estado em que está como vida.", disse Iran.

Já restava muito pouco tempo a Freitas, consumido pela velhice e suas conseqüências, por mais que a vida lhe fosse prolongada.

"Então já sabemos do resto da história. Ele levará a cabo suas experiências com computadores bioneurais. Eles não devem perder tempo e, neste exato momento, já devem estar invadindo o cérebro daqueles idiotas, garantindo que eles ainda acabarão gostando do que está acontecendo, até que gostar ou não gostar de algo deixe de fazer diferença."

"Eu confesso que senti-me tentado a continuar na sala. Toda a forma como as coisas foram colocadas, nossa responsabilidade pela continuidade da raça humana, a possibilidade de participar de algo tão novo..."

"Eu sei. Por isso você deve voltar agora. Outros dos cientistas que desistiram certamente voltarão também. Eles não podem se dar ao luxo de perder boas mentes e, com o processo iniciado e seu histórico pessoal, a chance de você ser escolhido como piloto é muito grande. Nós vamos precisar de alguém de nossa total confiança para que possamos acompanhar esta loucura e impedir que este monstro escravize a tudo e todos."

"Mas quem garante que eu não possa, mesmo à minha revelia, ser modificado, ou mesmo convencido a ficar do lado deles? Você sabe que eu tenho uma grande admiração por Kazinski e que ele, até agora, não errou..."

"Basta!" - disse Freitas em meio a um acesso de tosse - "Eu sei que você não sucumbirá a esta maldição. Mais do que isto, sei que você nos alimentará com informações valiosas que serão bem utilizadas no momento certo."

Iran sabia o quanto devia a Freitas e não iria desapontá-lo. Beijou a fronte do velho mestre e estabeleceu contato com a equipe do projeto de Kazinski.

-oOo=

O capitão abriu a comunicação com a nave para que todos pudessem ouvir a resolução do cluster. "Nave, estamos todos aqui!", disse ele.

"Pois bem, é sabido de todos que nossa missão é a preservação da raça humana, mesmo em face de sacrifícios pessoais, como lhes foi ensinado por nós e por seus antecessores."

"Sim, nave", responderam todos em uníssono, com exceção do cientista, que entendia tudo mas não conhecia tal ritual.

"Os dados transmitidos por G'reog nos revelaram coisas fascinantes que vamos compartilhar com vocês agora. Os insetos que vocês encontram no planeta são de origem terráquea. Pudemos observar nos pacotes originais que fragmentos de seus DNAs estavam misturados às sementes. Em alguns casos, pudemos encontrar sequências que, propriamente combinadas, possuem o código genético completo necessário à recriação dos mesmos. Não há dados suficientes, porém, para entendermos como eles vieram a ganhar vida neste planeta. Algumas sementes provêm de frutos que foram engolidos por pássaros e depois liberadas em suas fezes em eras remotas. Há porções genéticas tanto dos frutos, o que explica algumas das variedades no planeta que, supostamente, não estavam junto aos pacotes originais de sementes, como dos pássaros que os engoliram, ainda que não tenhamos detectado sinais de vida mais complexos que os das plantas e insetos, com exceção, claro, deste cientista que encontra-se entre vocês. Nossos registros mostram que seu nome é Iran e que ele foi parte do primeiro esforço de estabelecimento de novos celeiros alimentares que seriam a base das novas colônias humanas. Este planeta, ao que tudo indica, foi o único desta primeira fase que trouxe algum resultado, mas como houve a grande perda de dados relativa a estas missões, esta informação pode não estar totalmente correta."

Iran ouvia tudo como se uma memória muito distante fosse evocada, mas preferia manter-se, por enquanto, calado. Tudo o que acontecia era muito novo e a última coisa que ele queria é que o associassem com a tal grande perda de dados. Mas ele já adivinhava o que a nave falaria a seguir.

"Nossos sensores não parecem ser suficientes para explorar a completa natureza de Iran, mas nossos cálculos indicam que ele tem cerca de 600 anos, levando em conta o que nos resta de registros de sua missão e dos dados de posicionamento de seus sensores locais que nos foram transmitidos. A nave que o trouxe até aqui não se encontra mais em órbita. Ela pode ter escapado da gravidade do planeta e estar em qualquer lugar, o que é mais provável, pois não detectamos sua presença na superfície. De qualquer forma, a natureza deste planeta pode estar impedindo o bom funcionamento de nossos sensores. Precisamos que vocês busquem por essa nave e tentem colocá-la em funcionamento. Enquanto isto, seguimos tentando uma forma de trazer ao menos um de vocês à bordo, com segurança, para iniciar o processo de descontaminação."

Nadja sentiu o desconforto de Iran quando sua própria nave foi mencionada mas, como ele, manteve-se calada. A nave também havia detectado que Nadja havia sido fecundada, mas mais uma vez preferiu não compartilhar toda a informação que tinha.

Sobre o autor

Cesar Brod usa Linux desde antes do kernel atingir a versão 1.0. Dissemina o uso (e usa) métodos ágeis antes deles ganharem esse nome. Ainda assim, não está extinto! Escritor, consultor, pai e avô, tem como seu princípio fundamental a liberdade ampla, total e irrestrita, em especial a do conhecimento.

Mais sobre o Cesar Brod: [ Linkedin ] | [ Twitter ] | [ Tumblr ].

Veja a relação completa dos artigos de Cesar Brod