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Colaboração: Alexandre Oliva
Data de Publicação: 10 de dezembro de 2010
Venho confirmar o pedido de ampla divulgação IMEDIATA de uma sugestão importante, proveniente de um profundo conhecedor do tema, para tornar nosso regime de direito autoral mais útil e justo, construída sobre a proposta lançada no site http://www.compartilhamentolegal.org/
Ao que tudo indica, o projeto de lei de direito autoral do Ministério da Cultura, em processo de revisão após consulta pública, para envio ao Congresso em futuro próximo, não contemplará essas melhorias. Segundo fontes próximas ao MinC, porém, há possibilidade de que essa proposta venha a ser encaminha em projeto de lei subsequente, havendo demanda da sociedade. Há uma petição on-line com manifestações nesse sentido: http://www.compartilhamentolegal.org/compartilhamento/article/peticao-compartilhamento-legal
A carta, enviada por Richard M. Stallman à presidenta eleita e aos cidadãos brasileiros, está disponível em seu site pessoal http://stallman.org/ mais especificamente nos seguintes endereços:
Em Inglês: http://stallman.org/articles/internet-sharing-license.en.html
Em Português (tradução de Pablo Hess, com colaboração minha): http://stallman.org/articles/internet-sharing-license.pt.html
Seguem informações a respeito do remetente e a versão em português da carta.
Richard Stallman, autor da carta, é criador do Projeto GNU, sistema operacional que muita gente conhece incorretamente como Linux; do movimento social mundial pelo Software Livre, que promove, com fundamentação ética e social, o respeito às liberdades essenciais dos usuários de software como direitos humanos; da Free Software Foundation, organização que patrocina o projeto GNU e, junto a suas organizações irmãs ao redor do mundo, defendem direitos e liberdades de usuários e desenvolvedores de software.
É autor principal da licença GNU GPL, a primeira licença copyleft: um modelo de licenciamento de direitos autorais que ele inventou, que não apenas respeita, mas também defende as liberdades essenciais dos usuários, valendo-se do poder conferido pelas leis de direito autoral não para cercear liberdades, mas para exigir respeito às liberdades do próximo.
Já veio ao Brasil diversas vezes, inclusive para se dirigir aos integrantes do Congresso Nacional e para se reunir com Lula e Dilma, e já se reuniu com chefes de estado e ministros de diversos países, com papel crucial na definição de políticas de tecnologia de países latino-americanos como Brasil, Equador e Venezuela.
Suas muitas contribuições à sociedade têm lhe valido reconhecimento internacional, prêmios e títulos honorários de doutor. Suas ideias têm sido adaptadas a outros campos do conhecimento que não o software: movimentos de grande visibilidade no meio cultural, como o Creative Commons, reconhecidamente se basearam em suas ideias. É também ativista político em diversas outras questões relacionadas à liberdade, como se pode verificar em seu site pessoal, http://stallman.org.
Por essas e outras razões, quando ele escreve sobre temas como o direito autoral, muita gente lhe dá atenção.
Cara presidenta eleita Rousseff e cidadãos do Brasil
No debate brasileiro sobre a lei de direito autoral, uma melhoria importantíssima foi sugerida: a liberdade de compartilhar obras publicadas em troca de uma taxa cobrada dos usuários de Internet ao longo do tempo. Reconhecer a utilidade à sociedade do compartilhamento de arquivos via Internet entre os cidadãos será um grande avanço, mas esse plano levanta uma segunda questão: como utilizar o valor arrecadado? Se usado adequadamente, ele oferece a chance de um segundo grande avanço, em apoio à arte.
As editoras costumam propor usar o dinheiro para "recompensar" os "titulares dos direitos" -- duas más ideias juntas. "Titulares dos direitos" é uma forma disfarçada de direcionar o dinheiro principalmente às editoras em vez de aos artistas. Quanto a "recompensar", esse conceito é inadequado, pois significa pagar a alguém para fazer um trabalho, ou compensar essa pessoa por tirar algo dela. Nenhuma dessas descrições se aplica à prática do compartilhamento de arquivos, já que os ouvintes e espectadores não contrataram as empresas nem os artistas para realizarem um trabalho, e compartilhar mais cópias não lhes tira nada. (Quando eles alegam ser prejudicados, é em comparação com seus sonhos.) Editoras utilizam o termo "recompensar" para pressionar outros a verem a questão da forma como elas a vêem.
Não há necessidade de "recompensar" ninguém pelo compartilhamento de arquivos entre os cidadãos, mas apoiar os artistas é útil para a arte e para a sociedade. Se o Brasil adotar um sistema de taxa de licença para o compartilhamento, ele deve projetar o sistema para distribuir o dinheiro de forma a apoiar os artistas com eficiência. Com este sistema em funcionamento, os artistas se beneficiarão quando as pessoas compartilharem suas obras e incentivarão o compartilhamento.
Qual a forma eficiente de apoiar a arte com esse dinheiro?
Primeiramente, se o objetivo é apoiar os artistas, não dê a verba às editoras. Apoiar as editoras praticamente não apóia os artistas. Por exemplo, as gravadoras pagam aos músicos uma pequena parte ou nada do dinheiro que elas recebem pela venda de álbuns: os contratos de gravação dos músicos são minuciosamente projetados para que os músicos não recebam "seu" quinhão das vendas de álbuns a menos que um álbum venda um tremendo número de cópias. Se a arrecadação pelo compartilhamento de arquivos for distribuída às gravadoras, ela não alcançará os músicos. Contratos com escritores não são tão ultrajantes assim, mas até mesmo os autores de "best-sellers" podem receber pouco. O que a sociedade precisa é apoiar melhor estes artistas e autores.
Proponho, portanto, distribuir as verbas somente para os participantes criativos e garantir, por lei, que as editoras sejam impedidas de cobrá-las de volta ou deduzi-las do que devem ao autor.
A taxa seria cobrada inicialmente pelo provedor de conexão à Internet (prestador do Serviço de Comunicação Multimídia). Como ela deve chegar ao artista? Ela pode passar pelas mãos de uma agência estatal; ela pode passar por uma entidade arrecadadora, contanto que as entidades arrecadadoras sejam reformadas para que qualquer grupo de artistas possa iniciar a sua.
Entretanto, os artistas não podem ser compelidos a trabalhar para as entidades arrecadadoras já existentes, pois estas podem ter regras anti-sociais. Por exemplo, as entidades arrecadadoras de alguns países europeus proíbem que seus membros publiquem qualquer coisa sob lcienças que permitam o compartilhamento (por exemplo, usando qualquer uma das licenças "Creative Commons"). Se a verba do Brasil para apoiar artistas incluir artistas estrangeiros, eles não devem ser compelidos a fazer parte dessas entidades arrecadadoras para receberem sua fatia das verbas brasileiras.
Qualquer que seja o trajeto seguido pelo dinheiro, nenhuma das instituições desse trajeto (provedor, agência estatal ou entidade arrecadadora) pode ter qualquer autoridade para alterar quais fatias serão destinadas a quais artistas. Isso deve ser claramente definido pelas regras do sistema.
Mas quais devem ser essas regras? Qual a melhor forma de dividir o dinheiro entre todos os participantes criativos?
O método mais óbvio é calcular a fatia de cada artista em proporção direta à popularidade de sua obra. A popularidade pode ser medida convidando 100 mil pessoas escolhidas aleatoriamente a fornecer as listas de obras que executaram. É isso que propostas de "recompensar os titulares dos direitos" geralmente fazem. Mas esse método de distribuição não é muito eficaz para promover a arte, pois uma grande fração das verbas iria para as superestrelas, que já são ricas ou ao menos confortáveis, deixando pouco dinheiro para apoiar os artistas que realmente precisam delas.
Eu proponho que, em vez disso, se pague a cada artista de acordo com a raiz cúbica de sua popularidade. Mais precisamente, o sistema poderia medir a popularidade de cada obra, dividi-la pelos artistas da obra para obter um valor para cada artista, depois calcular a raiz cúbica disso e determinar a fatia dos artistas em proporção a estas raízes cúbicas.
O efeito disto seria aumentar a fatia dos artistas moderadamente populares por meio da redução da fatia das superestrelas. Cada superestrela ainda receberia mais do que cada não superestrela, até várias vezes mais, mas não centenas ou milhares de vezes mais. Com essa alteração, uma dada soma total de dinheiro conseguirá apoiar adequadamente um maior número de artistas.
Promover a arte e a autoria apoiando artistas e autores é o objetivo correto de uma taxa de licença para o compartilhamento porque é o objetivo correto dos próprios direitos autorais.
Uma última questão é se o sistema deve apoiar autores e artistas estrangeiros. Seria natural que o Brasil exigisse reciprocidade de outros países como condição para lhes dar apoio a autores e artistas, mas penso que isto seria um erro estratégico. A melhor forma de convencer outros países a adotarem um plano como este não é pressioná-los por meio de seus artistas -- eles não sentirão falta desses pagamentos porque não estão acostumados a recebê-los -- mas educar seus artistas quanto aos méritos deste sistema. Incluí-los no sistema é a forma de educá-los.
Outra opção é incluir artistas e autores estrangeiros, mas reduzir o pagamento a 1/10 quando seus países não cooperarem reciprocamente. Imagine dizer a um autor: "Você recebeu R$ 50 da taxa brasileira de licença para o compartilhamento. Se seu país tivesse uma taxa semelhante e fizesse um acordo recíproco com o Brasil, você agora teria recebido R$ 500 do Brasil, somado à quantia de seu próprio país."
Conheço um dos possíveis obstáculos à adoção deste sistema no Brasil: Tratados de Livre Exploração como aquele que estabeleceu a Organização Mundial do Comércio. Eles são projetados para fazer os governos agirem em benefício das empresas, não das pessoas; eles são os inimigos da democracia e do bem-estar da maioria das pessoas. (Agradecemos ao Lula por salvar a América do Sul da ALCA.) Alguns deles exigem "recompensa para os titulares dos direitos" como parte de sua política geral de favoritismo das empresas.
Felizmente, este obstáculo pode ser transposto. Se o Brasil se vir compelido a pagar pelo objetivo equivocado de "recompensar os titulares dos direitos", ele ainda pode adotar o sistema apresentado acima. Aqui está como.
O primeiro passo rumo ao fim de um domínio injusto é negar sua legitimidade. Se o Brasil for compelido a "recompensar os titulares dos direitos autorais", deve denunciar essa imposição como errada e ceder temporariamente a ela. A denúncia poderia ser colocada no preâmbulo da própria lei, da seguinte forma:
Considerando que o Brasil deseja incentivar a útil e prestativa prática de compartilhar, na Internet, obras publicadas;
Considerando que o Brasil é compelido pela Organização Mundial do Comércio a pagar aos titulares dos direitos o resgate dessa liberdade, mesmo que esse dinheiro vá apenas enriquecer as editoras em vez de apoiar artistas e autores;
Considerando que o Brasil deseja, além dessa exigência imposta, apoiar artistas e autores melhor do que o sistema atual de direitos autorais faz;
Em seguida, após estabelecer uma taxa para fins de "recompensa", estabelecer uma segunda taxa adicional (igual ou maior em valor) para apoiar os autores e artistas. O plano desperdiçador e equivocado da "recompensa" não deve ser um substituto para o plano útil e eficaz. Então, implemente-se o plano útil e eficaz para apoiar os artistas diretamente, pois isso é bom para a sociedade, e implemente-se a "recompensa" exigida pela OMC, mas somente enquanto a OMC mantenha o poder de impô-la.
Isto iniciará a transição para um novo sistema de direitos autorais adequado à era da Internet.
Obrigado por considerar estas sugestões.
Richard M. Stallman
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