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Plataformas de conhecimento: decifra-me ou te devoro!

Por Carlos Nepomuceno

Data de Publicação: 19 de Dezembro de 2007

Vivemos hoje um fato inédito na história da humanidade: a passagem em apenas uma geração de três plataformas do conhecimento: da digital (50- 90) à rede (95-04) e desta para a rede colaborativa (04-?).
Nenhum vento sopra a favor de quem não sabe para onde ir. (Sêneca)

Por que inventamos os grunhidos, a fala, a escrita, o livro? Por que o ser humano inventou o computador? Por que, na seqüência, bolou a internet e agora já dissemina a rede colaborativa?

Quais são os motivos que nos levam a criar sistemas de conhecimento baseados nas cada vez mais dinâmicas tecnologias de informação e comunicação?

São questões levantadas pela minha pesquisa de doutorado no Programa de Pós- Graduação em Ciência da Informação, convênio UFF-IBICT, tendo como orientador o professor Aldo Barreto, financiada pelo CNPq.

É a continuação do estudo que iniciei com o professor Marcos Cavalcanti, ao publicar o livro Conhecimento em Rede, no ano passado pela Editora Campus.

Que se desdobra agora no meu primeiro artigo acadêmico "As Plataformas de Conhecimento", publicado este mês de dezembro de 2007, na revista eletrônica DataGramaZero, que resumo aqui.

Partimos do princípio que a humanidade - diferente dos outros seres vivos do planeta - para sobreviver, se organiza, através de sistemas de conhecimento, tendo como núcleo central tecnologias de comunicação e informação, pela ordem na história: grunhido, fala, escrita, livro, computador, meios de comunicação de massa, internet e agora, a nova rede colaborativa, que têm como núcleo central ferramentas colaborativas.

Os sistemas de conhecimento sempre tiveram missão de disseminar e confrontar idéias, tirando da informação significados relevantes, para gerar desenvolvimento e permitir que a espécie humana sobrevivesse e evoluísse ao longo dos séculos tanto para comer, vestir, morar, criar.

Até aqui, sistemas de conhecimento não ganharam importância devida na história, pois demoravam séculos para serem alterados.

Mas atualmente com o ambiente de inovação atual isso mudou.

Passaram a ser alterados a cada década (com a tendência a diminuir esse intervalo) ganhando assim status de conceito-chave para entender nosso futuro.

Conceituamos esses sistemas como Plataformas de Conhecimento, que - ao longo da história - têm nos ajudado na luta pela sobrevivência humana.

Eis, de forma preliminar, as regras básicas das plataformas, que cheguei até aqui com minha pesquisa:

  1. As plataformas de conhecimento não são lineares. Pelo contrário, apresentam quebras, rupturas. Esgotam-se pela incapacidade de continuarem eficazes na evolução da sociedade (vide o discurso oral, o livro, o computador, a própria internet sem colaboração). Quando um ciclo termina, a plataforma entra em declínio, surge a nova, incorporando e transformando o fluxo de informação da anterior com novo dinamismo;

  2. Desta forma, uma nova plataforma surge para resolver impasses (entropias) criadas e deixadas pela última e trazer novo espaço de inovação e desenvolvimento para a sociedade. O livro impresso e os jornais foram utilizados por Martinho Lutero para acabar com o monopólio de saber da Igreja Católica. Como a rede nos trouxe o MP3; e a rede colaborativa, ainda incipiente, o Linux. Ambas, quebram monopólios de produção de conhecimento atuais;

  3. Mas, ao mesmo tempo que desata nós, a nova plataforma já traz em si novas entropias, pois, ao aumentar a velocidade e o fluxo das informações de forma mais dinâmica, gera, já no momento que surge, novos problemas de significado, ao não permitir transformar o volume disperso de informação em conhecimento, gerando, ao mesmo que resolve um problema, um novo, criando a necessidade para a nova plataforma;

  4. A nova plataforma que surge estará sempre contida na anterior, como foram os diferentes ambientes colaborativos na rede, dos chats ao YahooGroups, antes da difusão em massa da rede colaborativa;

  5. Cada plataforma tem, assim, uma tecnologia-mãe, um núcleo central, que impulsiona todo resto. Ontem foi o grunhido, a fala, a escrita, o livro, o computador, a rede eletrônica. Hoje, entramos na plataforma da rede colaborativa (na qual as ferramentas colaborativas, como já dissemos, impulsionam a nova dinâmica);

  6. As plataformas sempre foram criadas, até aqui, de forma espontânea e não planejada, através de tecnologias-núcleos, que não tiveram na sua concepção a dimensão do seu verdadeiro potencial. Nem Gutemberg projetou a prensa de tipos móveis para viabilizar as revoluções européias que se seguiram, nem os cientistas americanos imaginaram que a rede de longa distância (batizada tempos depois de internet) teria bilhões de usuários em menos de 20 anos de existência e mudaria a configuração da sociedade;

  7. Ao serem apoderadas e disseminadas pelos que querem mudar e inovar, as novas plataformas passam por um ciclo rápido de expansão, a partir da adesão dos habitantes do planeta, que, intuitivamente, percebem nelas vantagens sobre a anterior. Assim, o que define a difusão de uma plataforma não é apenas a vontade de difundi-la, mas a real capacidade de acelerar o fluxo da informação e de ganhar, com isso, a adesão das pessoas. Sem massificação, portanto, não existe plataforma;

  8. Elas, entretanto, não são homogêneas na sua difusão. Já que até hoje existem tribos indígenas que não têm escrita, comunidades adultas que não sabem ler, outras tantas que nunca viram computador e muitas que já o utilizam, mas ainda não se conectaram em rede, muito menos participaram de comunidades online;

  9. Mas, apesar de não homogêneas, tendem a hegemônicas para geração de valor, atraindo os setores mais dinâmicos, que necessitam delas para sobreviver, impondo o novo padrão ao resto da sociedade ao longo do tempo. É fato: aonde existir e estiver se formando riqueza, a nova plataforma será adotada e largamente utilizada! E, o oposto, também se aplica: aonde não for adotada, deixará um rastro de pobreza. (Quem sabia ler, ficou com as melhores terras!);

  10. Cada plataforma que surge abre novo ciclo de mudanças sociais, políticas e econômicas. Ou seja, delineiam o ambiente para que o ser humano gere novas idéias e, assim, movimente, na luta pelo poder (de ter, ser, dominar e fazer) a roda da história. Não haveria revolução francesa sem o livro e os jornais; nem Linux, sem internet. Uma mudança alimenta a outra em um processo dialético.

    Vivemos hoje, portanto, um fato inédito na história da humanidade, a passagem - em apenas uma geração - de três plataformas do conhecimento: da digital (50-90), à rede (95-04) e desta para a rede colaborativa (04-?).

    Criando um novo paradoxo contemporâneo: a cada nova plataforma, mais velocidade, mais soluções, problemas e entropias, num ciclo cada vez menor, que como uma esfinge nos pergunta, ainda sem resposta no Google ou no Wikipedia:

    Decifra-me, ou te devoro!

Sobre o autor

Carlos Nepomuceno é Doutorando em Ciência da Informação pela Universidade Federal Fluminense é consultor e jornalista especializado em Tecnologia (Informática e Internet), com larga experiência em projetos nestas áreas. Foi um dos primeiros webmasters do Brasil. Atualmente, presta consultoria permanente para as seguintes instituições: Petrobras, IBAM e Sebrae-RJ. É professor do MBA de Gestão de Conhecimento do CRIE/Coppe/UFRJ, com a cadeira "Inteligência Coletiva" e coordenador do ICO - Instituto de Inteligência Coletiva.

É autor, com Marcos Cavalcanti, do livro O Conhecimento em Rede Publicado pela Campus/Elsevier, é o primeiro livro no Brasil a discutir a WEB 2.0, a levantar paradigmas quanto à inteligência coletiva e a mostrar, na prática, como implantar projetos desta natureza. O livro trata desta nova revolução cultural, social e tecnológica a que todos estamos expostos.

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